terça-feira, janeiro 11, 2011

Poesia

Jonathan do Nascimento Oliveira
João Pessoa – PB, aos 16 de abril de 2010.

Sou matuto entalhado na madeira
Da baraúna extraída do miolo
Sou mulato, sou índio, sou crioulo.
Exemplar dessa raça brasileira
Camumbembe a gritar em “mei” de feira
Sou nascente do rio Pajeú
Moquidão que castiga a o teiú
Cascavel que do oco dar o bote
Sou o grito estridente do cassote
Entre as prezas de uma surucucu

Sou um doido fazendo profecias
Ao narrar um a um os seus tormentos
A tristeza encerrada nos jumentos
Sou a força que brota das Marias
Severinas que brancas como os dias
O silêncio da noite decantaram.
Tempestades de açoites que levaram
O enlace das palhas do coqueiro
Como que num abraço derradeiro
De guerreiros vencidos que lutaram.

Sou reisado, sou frevo e cantoria
Sou novena pra Virgem em mês de maio
Sou moleque ensinando um papagaio
A falar todo tipo de heresia
Sou palavra empenhada à freguesia
Pra provar quanto é nobre o sertanejo
Sou “pifeiro”, sou gaita e realejo
Sou o boi, o cavalo e o vaqueiro
Na caatinga, sou grota e tabuleiro
A jurema, o facheiro e o carquejo

Sou a canga, o canzil e o “tamoeiro”
Sou a ponta afiada do ferrão
Cabeçalho, as rodas e o cocão
Os fueiros, a mesa e o carreiro
Sou o eixo que em brado verdadeiro
Faz tocar a cantiga do sertão
Sou o aboio que sai do coração
Pelo duto da goela do vaqueiro
Sou o galo que canta no poleiro
Sou seis horas, sou mais uma oração

Sou enchente que lava o baixio
Quando o inverno se mostra onipotente
Sou a seca que torra incontinente
Sou o leito sem água de um rio
Sou a luz que alumia de um pavio
Sou o terço nas mãos da benzedeira
Que de frente a um menino com papeira
Reza tudo que vem à sua mente
Sou criança nas mãos da assistente
Sou o pai, sou a mãe, sou a parteira

Sou a areia do rio Pajeú
Nas lembranças do tempo de menino
Sou saudade que faz perder o tino
Do passado lá no “Tejuaçu”
De boiar nos troncos de mulungú
Nas cacimbas abertas pela enchente
De rever novamente toda a gente
Que chegava no tempo da moagem
Se envolver numa só camaradagem
Entoando improvisos de repente.

Vim ao mundo em dupla natalidade
E sou filho de quatro antecedentes
Me eduquei com o quarteto precedente
Hoje só me restando uma trindade
Quatro vigas que tenho por verdade
Como base da minha fortaleza
Mas o tempo sem dó e com frieza
Tem minado minha sustentação
Me levou um pilar sem compaixão
Deixou outro fadado à incerteza.

Mas já disse que sou um sertanejo
Calejado de angustia e dissabores
E aprendi a fazer das minhas dores
Uma escola de voltas e traquejo
Faço escoras de força e de desejo
Com as quais refiz minha fundação
No lugar das pilastras, sei que não
Terei nunca quem bote em seus lugares
E as escoras terão que ser milhares
Se as três que me resta vierem ao chão.

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